Farpas
"E na epiderme de cada facto contemporâneo cravaremos uma farpa: apenas a porção de ferro estritamente indispensável para deixar pendente um sinal."
16 de outubro de 2025
15 de outubro de 2025
O dia seguinte aqui no aeródromo
As eleições passaram e ganharam os do costume. Talvez bastasse esta frase para resumir o que se passa em Pombal, só que não. O que tentamos fazer aqui no Farpas é deixar uma marca, para quem vier depois, e por isso é importante juntar a esse repositório algumas notas sobre este momento que parece inédito.
1. O PODER. O PSD continua a fazer bem o seu trabalho, e a fazê-lo sem oposição. A ideia de "vitória histórica", aplicada às 17 freguesias do concelho, pode colar bem nos que chegaram há pouco, nas redes sociais e no discurso global, mas é preciso ser-se rigoroso: não é a primeira vez que o PSD domina tudo, com as suas pessoas (Carnide, 2001, com um movimento supostamente independente, liderado por Eusébio Rodrigues). A única excepção, nalguns actos eleitorais dos últimos 32 anos (desde que o PS perdeu a Câmara) terá sido o Louriçal, freguesia que ficou aliás conhecida como "a aldeia gaulesa", em duas ocasiões. E mesmo assim, numa delas, aconteceu com um candidato que vinha do PSD. Não haja ilusões: terá sempre bons resultados o poder que se perpetua, tem as suas peças bem distribuídas no xadrez (desafio-vos a olhar para a composição de associações e instituições), enquanto põe a mão no ombro dos que ousam levantar a cabeça.
2. A 'OPOSIÇÃO'. a)O PS continuará a somar derrotas enquanto não tiver coragem de se assumir como oposição. O comunicado divulgado ontem, a prometer "oposição construtiva" (música para os ouvidos de Pedro Pimpão, que logo o aproveitou) mostra bem que ali não há vontade nenhuma de tirar ilacções sobre escolhas e resultados, causas e consequências. Resta saber o que vai fazer com o único lugar na vereação, para o qual Fernando Matos não tem o mínimo de apetência.
b) O movimento Pombal Independentes - criado a reboque do efeito bem sucedido no Oeste, nos últimos anos, deu em quase nada. Apesar de Luís Couto ser eleito há muito como adversário preferencial de PSD e PS (o que indiciava bem o potencial), faltou-lhe coragem - para confrontar, denunciar (o episódio com a direcção da AHBVP, a propósito da cedência de um espaço, é épico) e mensagem. Pode ter o condão de trazer de novo para o espaço público um homem como António Moderno, cujo papel foi relevante na construção do poder local democrático neste concelho.
c) o Chega. Manuel Serra foi eleito sem fazer um único dia de campanha, sem programa, mas também não era preciso. Não é por acaso que André Ventura usou a sua cara em todos os cartazes de todos os concelhos deste país. O antigo presidente da União de Freguesias do Oeste, que até há meses era militante e dirigente do PSD, apanhou boleia do partido que mais rapidamente o levaria ao destino: a cadeira de vereador na Câmara Municipal. Alcança a maior percentagem de votação nas freguesias onde, aposto, nem sequer o conhecem.
Perante este estado da arte, e sabendo nós que ninguém consegue parar o vento com as mãos, este post é especialmente dirigido àqueles que, vivendo aqui, têm a honestidade de perceber que esta hegemonia não é boa para ninguém. Faz mal à democracia, dissipa a massa crítica, asfixia o ambiente. Mas isso só percebe quem está fora da bolha laranja, que é gigante, e onde cabe sempre mais um. O único caminho é levantar a cabeça e ser cidadão. Na rua, no bairro, na colectividade, num colectivo qualquer. Ir às Assembleias de Freguesia, à Assembleia Municipal, participar nas reuniões da escola e do clube dos filhos. E abrigar-se do vento.
14 de outubro de 2025
PS de Pombal
Ontem, depois do desastre, o PS de Pombal sussurrou qualquer coisa - sinal de que ainda está vivo! Alguém o ouviu dizer que “felicita o vencedor autárquico e promete oposição construtiva”.
Se tivesse dito só a primeira frase, e, logo de seguida, se apagasse, mostrava autoconsciência e alguma sensatez. Assim, mostrou que continua a penar, a fazer o que não sabe nem deve tentar fazer - oposição construtiva.
12 de outubro de 2025
Autárquicas 2025 em Pombal – tudo na mesma
O PSD voltou a ganhar; e os outros a perder. Por conseguinte, o doutor Pimpão continuará a presidir à “junta” e às juntas, acompanhado por criaturas ainda mais imberbes que ele. E os outros continuarão a assistir, ou a desistir. E assim tudo continuará na mesma, devagar e devagarinho, como a lesma. É uma vitória que tem tanto de plena – arrebanhou todos os “tachos” - como de pequena, que não traz nada de novo, só estragos no dia seguinte.
O resto é só derrotados. Todos iguais (na fatalidade), e todos diferentes (no estado de espírito momentâneo: uns felizes, com pequenos nadas; outros desiludidos, com o estilhaço das ilusões ocas; e outros simplesmente aliviados do martírio a que inutilmente se submeteram).
A “história” eleitoral repete-se demasiado por aqui. A repetição, como diz a psicanálise, protege da agitação da vida individual, impõe a paz mortal de uma cultura que bane a surpresa, é “morte”. Os resultados mostram o declínio da confiança dos cidadãos nos políticos locais, nos partidos e no poder local, uma orfandade colectiva e uma falta de sentido de colectividade e de comunidade assente numa representatividade justa e plural.
Em Democracia é a oposição que determina o exercício do poder. Deixaremos de ter oposição, papel reservado simbolicamente a um ou outro ramo de enfeite. Na verdade, já não a tínhamos; e daí vem, com certeza, uma das explicações para este desastre da dita oposição.
O PS não conseguiu nada (relevante), nem poderia conseguir, míngua para o mínimo absoluto. Só mentes muito etéreas poderam crer em coisa diferente… Nas coisas dos humanos, a essência precede sempre a existência. E como diz o povo, o que nasce torto tarde ou nunca se endireita. É um resultado que deixa marcas no partido e em quem deu a cara pela aventura. Mas sejamos justos: a responsabilidade maior não deve ser assacada aos que deram a cara pela desventura, mas a quem traçou todo o guião e, depois, perante o evidente desastre, se escondeu na toca.
O Chega participou e mostrou o que é... Pelo meio e no final, proporcionou o cumprimento do desejo de Manuel Serra: chegar a vereador.
O Independente Luís Couto cumpriu com brio o desafio inglório de tentar chegar a vereador. Jogava nestas eleições a afirmação do seu movimento político e o seu destino político. Falhou. A política nunca é só um desafio pessoal. Falhou o objectivo.
Do resto não vale a pena falar - o nada é nada.
10 de outubro de 2025
Debate entre os candidatos à câmara - remake
Decorreu ontem à noite o segundo debate entre os candidatos (participantes) à câmara, organizado e moderado pelos órgãos de “informação” locais (Pombal Jornal, Rádio Clube de Pombal e Rádio Cardal).
O debate foi melhor que o anterior - já teve laivos de debate - por três razões: (i) era muito difícil fazerem pior que no anterior; (ii) foi melhor preparado e moderado pelos moderadores; e (iii) alguns candidatos estiveram melhor. Só uma coisa piorou: a assistência – a rapaziada do PPD/PSD, juvenil e adulta, com o deputado da nação em particular realce. Mas a coisa continua pobre: continua-se a afunilar o debate para temas de política geral (Saúde, Educação, Habitação, Ambiente, Economia, Turismo, Segurança, etc.), onde só se debitam banalidades, e a passar-se ao lado da discussão das competências, desempenho, insuficiências e organização da câmara.
De entre os candidatos com maior responsabilidade política-eleitoral – Pedro Pimpão (PSD) e Fernando Matos (PS) - ficou no ar uma dúvida porventura insolúvel: qual deles é o mais lunático: o que quer voar sobre Pombal ou o que quer(eria) subir de elevador para o castelo? Mas quem anda com os pés assentes na terra e se preocupa com coisas realmente importantes, como a liberdade individual e a privacidade, tem que ficar alarmado quando sete daquelas alminhas defendem a criação de uma política municipal e a colocação de câmaras de vigilância nos espaços públicos. Aqui, palmas para o candidato da IL (Ricardo Santos) que quebrou o unanimismo.
Uma nota final para os candidatos do CDS (Telmo Lopes) e dos Independentes (Luís Couto), que estiveram francamente melhor que os restantes e melhor que no debate anterior.
8 de outubro de 2025
Breve história de um debate que era da Junta mas os candidatos não sabiam
Na foto, da esquerda para a direita: João Gonçalves (CDS), Carla Longo (PSD), António Costa (CDU), António Sintra (Pombal Independentes), Patrício Martins (Chega) e Clara Pascoal (PS)
Sou eleitora da Junta de Freguesia de Pombal há mais de 20 anos, já integrei uma lista que lhe queria dar outra vida mas não aconteceu, também fiz parte da Assembleia de Freguesia - um tempo que me permitiu, entre outras coisas, conhecer melhor como funciona (politicamente falando) o Pedro, actual presidente da Câmara.
Ao contrário do que muitos pensam - e dizem, incluindo candidatos - a Junta de Pombal não é uma área de descanso na hierarquia municipal. É certo que ocupa um espaço privilegiado na sede de concelho, mas desengane-se quem pensa que tem tudo feito, à conta da Câmara. Primeiro porque é uma freguesia muito mais rural do que se imagina. Não apenas porque a cidade se ruralizou nos últimos anos, mas também porque os 700 km de estradas de que fala a presidente da Junta ligam aldeias e lugares que parecem ter ficado nos anos 60. Nunca recuperámos das diversas vagas de emigração, e não fora a imigração (que serve, nesta campanha, para mascarar o desfalecimento, nomeadamente a plena ocupação das escolas), muitas aldeias desta freguesia estavam já quase abandonadas.
Ora, o debate de ontem - com seis candidatos e mais de duas horas e meia de duração - tinha muito terreno para palmilhar. Só que uma confusão generalizada (que começou nos temas propostos para discussão e acabou no equívoco de vários candidatos) não contribuiu em nada para o esclarecimento. Há candidatos , que não perceberam ao que se estão a candidatar. Há outros para quem afinal está tudo bem, e isto só precisava de mais um pózinhos, qual comissão de melhoramentos. O único momento que se assemelhou a um debate foi breve, entre a actual presidente da Junta, Carla Longo (PSD), e a candidata do PS, Clara Pascoal.
Terminada a conversa, abri os desdobráveis que me deixaram na caixa do correio. Só tinha da Carla Longo e do António Sintra. São programas cheios de boas intenções, ao estilo "agora é que vai". E numa coisa ela já ganhou: calou uma certa oposição, arregimentando para a sua lista uma panóplia de gente que sempre combateu aquela forma de fazer política - até perceber que era melhor fazer parte do ramalhete. Juntaram-se vários presidentes de clubes, que assim sossegam. É mais ou menos como diz o seu mentor Pimpão: "até os comemos!"
6 de outubro de 2025
Breves notas sobre o debate (III)
Quem já passou por um processo de recrutamento minimamente estruturado sabe que há um momento que pode ser decisivo; é quando, no final da última entrevista, o recrutador faz a pergunta da praxe: “para terminar, num minuto, convença-me que é a pessoa indicada para a função?”
Perante este desafio, imaginem que um qualquer imberbe, sabendo que a pergunta lhe iria ser colocada, levava de casa um papelinho com a resposta preparada e, no momento certo, sacava-a do bolso, colocava-a em cima da mesa, ferrava os olhos nele e lia-o o melhor que sabia. Estão a ver a cena? E o resultado?
No famigerado “debate” entre os “candidatos/participantes” na eleição para a CM Pombal, o moderador deu a inevitável deixa final: um minuto para cada candidato fazer o apelo ao voto na sua candidatura. Os OITO candidatos limitaram-se a cumprir a formalidade. A maioria comportou-se como o imberbe candidato ao emprego: sacou da cábula que levava no bolso e leu-a com o jeito que Deus Nosso Senhor lhe deu!
Querem o melhor retrato da pobreza franciscana que nos colocaram na rifa? Ei-lo.
5 de outubro de 2025
Breves notas sobre o debate (II)
O debate – se isso se pode chamar a banalidades debitadas sem jeito e sem qualquer contraditório - foi uma verdadeira enfiada de vulgaridades e sandices. Mas uma, pela clareza e respectiva quantificação, destacou-se e fica para posteridade.
A emblemática proposta saiu, logo a abrir, da boca do candidato da CDU – Egídio Farinha: 1% do orçamento municipal para a Cultura, e a criação de uma Escola de Artes! Logo o alertaram que a câmara já gasta mais de 3% do orçamento nessa área. Mas ele manteve-se impávido – já tinha deixado o seu número.
O nada não comporta superioridade, nem inferioridade, nem comparação. Caímos nisto.